INTRODUÇÃO À PSICOLOGIA
MULTIDISCIPLINAR
A Psicologia da Saúde é um campo que estuda os processos
psicológicos associados à saúde e à doença, com ênfase nas práticas de promoção
da saúde e na prevenção de enfermidades. Seu objetivo central é compreender
como fatores comportamentais, emocionais, cognitivos, sociais e culturais
influenciam o bem-estar físico, a adesão a tratamentos médicos, o enfrentamento
de doenças e a qualidade de vida. Esta área integra conhecimentos da
Psicologia, da Medicina, da Saúde Pública e das Ciências Sociais, e atua na elaboração
de intervenções voltadas para indivíduos, grupos e comunidades.
O presente texto explora a evolução da Psicologia da Saúde,
seus principais conceitos, as práticas de promoção da saúde e as estratégias de
prevenção de doenças, ressaltando a importância da abordagem biopsicossocial na
atenção integral ao ser humano.
Origem e Evolução da
Psicologia da Saúde
Antes da consolidação da Psicologia da Saúde como campo
específico, já existiam práticas voltadas à integração dos fatores psicológicos
no contexto da Medicina. A Psicologia
Médica surgiu no século XIX como um conjunto de técnicas psicológicas
aplicadas ao cuidado de pacientes, buscando melhorar a relação médico-paciente
e favorecer a adesão ao tratamento.
A partir do século XX, o movimento psicossomático enfatizou a importância das emoções e dos conflitos
inconscientes no desenvolvimento de doenças físicas. Pesquisadores como Franz
Alexander propuseram que certas patologias, como úlceras gástricas e
hipertensão, tinham origens psicossomáticas, destacando a interconexão entre
mente e corpo.
A Psicologia da Saúde consolidou-se como subárea nos anos
1970, especialmente nos Estados Unidos, em resposta às mudanças nos padrões de
morbimortalidade e ao reconhecimento de que comportamentos individuais
desempenham papel crucial na saúde.
O modelo biomédico tradicional, baseado na separação entre
corpo e mente, mostrou-se insuficiente para lidar com as doenças crônicas não
transmissíveis (como diabetes, hipertensão e câncer), exigindo uma abordagem
mais integrada e abrangente.
A definição de Saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS)
como "um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não
apenas a ausência de doença" (1948) fundamenta o escopo da Psicologia da
Saúde.
O modelo biopsicossocial,
proposto por George Engel (1977), substitui o paradigma biomédico, afirmando
que a saúde e a doença resultam da interação dinâmica entre fatores biológicos,
psicológicos e sociais.
Este modelo orienta as práticas da Psicologia da Saúde,
reconhecendo que variáveis como crenças, comportamentos de saúde, suporte
social, estresse e acesso a recursos impactam decisivamente o adoecimento e a
recuperação.
Principais Conceitos
da Psicologia da Saúde
A promoção da saúde refere-se ao conjunto de estratégias
que visam capacitar os indivíduos e as comunidades para aumentar o controle
sobre sua saúde e melhorá-la. É uma abordagem proativa, centrada no
fortalecimento de fatores protetores e na criação de condições de vida
saudáveis.
A Carta de Ottawa (1986) define promoção da saúde como "o processo de capacitação das pessoas para aumentar o controle sobre sua saúde e melhorála", enfatizando a importância da equidade, da participação comunitária e da ação intersetorial.
A prevenção de doenças envolve ações destinadas a evitar a
ocorrência de doenças (prevenção primária), a detectar precocemente
enfermidades (prevenção secundária) ou a reduzir as complicações e promover a
reabilitação de condições já instaladas (prevenção terciária).
A Psicologia da Saúde atua nas três esferas da prevenção,
promovendo mudanças comportamentais, campanhas educativas, programas de
rastreamento e intervenções de suporte psicológico.
Comportamentos de
saúde são ações que contribuem para a manutenção ou melhoria da saúde, como
prática de atividade física, alimentação equilibrada e não fumar.
Comportamentos de
risco são práticas que aumentam a probabilidade de adoecimento, como
consumo de álcool em excesso, sedentarismo, dietas inadequadas e não adesão a
tratamentos médicos.
A modificação de comportamentos de risco é um dos focos
principais da intervenção psicológica em saúde.
Promoção da Saúde na
Psicologia
No nível individual, a Psicologia da Saúde utiliza
intervenções como:
• Psicoeducação: fornecer informações
sobre saúde, doença e autocuidado.
• Terapias cognitivo-comportamentais:
mudar pensamentos e comportamentos disfuncionais relacionados à saúde.
• Motivational Interviewing: técnica de entrevista motivacional que promove a mudança comportamental centrada
no
paciente.
Exemplos de aplicação incluem programas para cessação do tabagismo, controle do estresse, manejo da dor e promoção da atividade física.
Em nível comunitário, ações de promoção da saúde incluem:
• Campanhas
educativas (prevenção de HIV/AIDS, promoção da vacinação, combate à obesidade).
• Programas
escolares de educação para a saúde.
• Intervenções
em ambientes de trabalho para redução do estresse ocupacional.
A participação comunitária é fundamental para a eficácia
dessas ações, respeitando as especificidades culturais e sociais de cada grupo.
A criação de ambientes
saudáveis — escolas promotoras de saúde, cidades saudáveis, ambientes de
trabalho saudáveis — é uma estratégia essencial para promover o bem-estar
coletivo, abordando determinantes sociais da saúde como educação, habitação,
segurança e lazer.
Prevenção de Doenças
na Psicologia
A prevenção primária busca evitar a instalação de doenças.
Exemplos de ações incluem:
• Programas
de vacinação.
• Campanhas
de incentivo à prática de exercícios físicos.
• Educação
sexual para
prevenção de doenças sexualmente transmissíveis.
O psicólogo atua na elaboração de materiais educativos, na
realização de palestras e no desenvolvimento de programas comportamentais de
promoção de hábitos saudáveis.
A prevenção secundária visa detectar precocemente doenças
para tratamento imediato, minimizando suas consequências.
Exemplos incluem:
• Triagem
para depressão em escolas e ambientes de trabalho.
• Programas
de rastreamento para câncer (como mamografia).
A atuação psicológica envolve sensibilização, redução do
estigma e suporte emocional para indivíduos em risco.
A prevenção terciária busca minimizar as sequelas de
doenças já estabelecidas, promovendo a reabilitação e a reintegração social.
Exemplos:
• Reabilitação
de pacientes com acidente vascular cerebral.
• Apoio
psicológico para pacientes oncológicos e seus familiares.
A Psicologia da Saúde intervém no fortalecimento de
habilidades de enfrentamento, adesão ao tratamento e melhora da qualidade de
vida.
Fatores Psicológicos
que Influenciam a Saúde
O estresse crônico é um dos fatores de risco mais importantes para uma variedade de doenças, como hipertensão arterial, infarto
dos fatores de risco mais
importantes para uma variedade de doenças, como hipertensão arterial, infarto
do miocárdio e depressão.
O psicólogo atua no manejo do estresse através de técnicas
de relaxamento, mindfulness, terapia cognitivo-comportamental e programas de
promoção do bem-estar.
O suporte social é um fator protetor reconhecido, associado
a melhor recuperação de doenças e maior adesão a tratamentos.
A intervenção psicológica busca fortalecer redes de apoio
social e promover habilidades de relacionamento interpessoal.
Baixa adesão a tratamentos médicos é um problema recorrente
em doenças crônicas. A Psicologia da Saúde desenvolve estratégias motivacionais
e de educação em saúde para aumentar a adesão e reduzir abandonos terapêuticos.
As crenças e representações sociais sobre saúde e doença
influenciam comportamentos preventivos e a procura por cuidados médicos.
Modelos como o Health Belief Model ajudam a compreender
como percepções de vulnerabilidade, severidade e benefícios da ação influenciam
a adoção de comportamentos de saúde.
A Psicologia da Saúde ocupa um papel central na construção
de práticas de promoção da saúde e prevenção de doenças que reconheçam o ser
humano em sua complexidade biopsicossocial.
Seus profissionais atuam em hospitais, unidades básicas de
saúde, escolas, empresas, organizações não governamentais e na formulação de
políticas públicas.
A efetividade das ações em saúde depende da integração
entre profissionais, do respeito às especificidades culturais e da promoção da
autonomia dos indivíduos e comunidades.
Investir na promoção da saúde e na prevenção de doenças é
um caminho essencial para a construção de sociedades mais saudáveis,
equitativas e sustentáveis.
• ENGEL,
George L. The need for a new medical
model: a challenge for biomedicine. Science, v. 196, n. 4286, p. 129-136,
1977.
• ORGANIZAÇÃO
MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Carta de
Ottawa para a
Promoção da Saúde. Ottawa: OMS, 1986.
• SARAFINO,
Edward P.; SMITH, Timothy W. Health
Psychology: Biopsychosocial Interactions. New York: Wiley, 2014.
• SPIEGEL,
David; GLAUBER, Jeffrey. Psicologia da
saúde. In: WEINER, Irving B. (org.). Manual
de Psicologia Clínica. Porto Alegre: Artmed, 2008.
• DIMENSTEIN, Magda. O psicólogo na atenção básica: desafios para uma prática voltada para a promoção da
saúde. Psicologia:
Ciência e Profissão, v. 19, n. 1, p. 74-85, 1999.
• CASTRO,
Silvia Helena. Promoção da saúde:
conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2011.
As doenças crônicas representam um grande desafio para a
saúde pública e para a prática clínica, não apenas em razão de sua longa
duração e complexidade, mas também pelos profundos impactos psicológicos que
provocam nos indivíduos. Compreender as dimensões emocionais e cognitivas
associadas às doenças crônicas é fundamental para a formulação de estratégias
terapêuticas mais eficazes. Além disso, o fenômeno da somatização — a
manifestação de sintomas físicos sem causa médica detectável — evidencia a íntima
relação entre mente e corpo. Este texto examina os principais aspectos
psicológicos das doenças crônicas e da somatização, destacando seus efeitos,
suas explicações teóricas e suas implicações para o cuidado em saúde.
Doenças Crônicas:
Definição e Contexto
As doenças crônicas são condições de saúde que apresentam
longa duração, progressão lenta e, frequentemente, curso permanente. Exemplos
incluem diabetes mellitus, hipertensão arterial, doenças cardiovasculares,
câncer, doenças respiratórias crônicas, doenças reumáticas e condições
neurológicas degenerativas.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2010),
as doenças crônicas são atualmente a principal causa de morte no mundo, sendo
responsáveis por mais de 70% dos óbitos globais. Sua prevenção e manejo exigem
intervenções integradas que considerem fatores biológicos, comportamentais,
sociais e psicológicos.
O diagnóstico e a convivência com uma doença crônica geram
repercussões emocionais profundas, que podem comprometer a qualidade de vida, a
adesão ao tratamento e a evolução clínica. Os principais impactos incluem:
• Mudanças
na identidade pessoal e na autoimagem.
• Estresse
psicológico relacionado ao controle da doença.
• Sentimentos
de tristeza, ansiedade e medo.
• Dificuldades
nos relacionamentos interpessoais e sociais.
• Alterações
na rotina de vida e perda de autonomia.
O enfrentamento eficaz dessas alterações requer suporte
psicológico contínuo, adaptado às fases e às necessidades individuais de cada
paciente.
Aspectos
Psicológicos Associados às Doenças Crônicas
O
estresse é tanto uma consequência quanto um fator
agravante das doenças crônicas. Segundo Lazarus e Folkman (1984), o estresse
ocorre quando as demandas do ambiente superam os recursos pessoais de
enfrentamento.
Em pacientes com doenças crônicas, o estresse pode ser
desencadeado por:
• Incertezas
sobre a progressão da doença.
• Procedimentos
médicos invasivos e prolongados.
• Limitações
físicas e perda de funcionalidade.
• Mudanças
econômicas e profissionais.
O estresse crônico contribui para alterações fisiológicas,
como a liberação de cortisol, que pode piorar quadros inflamatórios e
metabólicos.
Depressão e Ansiedade
A prevalência de depressão e transtornos de ansiedade é
significativamente maior em pessoas com doenças crônicas do que na população
geral. Estudos indicam que até 30% dos pacientes crônicos apresentam sintomas
depressivos clinicamente relevantes (Katon, 2011).
A depressão pode:
• Reduzir
a motivação para aderir ao tratamento.
• Aumentar
a percepção da dor e da fadiga.
• Piorar
a evolução clínica da doença.
A ansiedade, por sua vez, está associada ao medo do
agravamento da condição, às preocupações financeiras e à incerteza sobre o
futuro.
A adesão a regimes terapêuticos complexos — incluindo
medicações, dietas, exercícios físicos e autocuidados — é um dos maiores
desafios no manejo das doenças crônicas.
Fatores psicológicos que influenciam a adesão incluem:
• Compreensão
do diagnóstico e do tratamento.
• Crenças
pessoais sobre saúde e doença.
• Expectativas
realistas ou irrealistas sobre a cura.
• Apoio
social percebido.
Modelos teóricos, como o Health Belief Model (Rosenstock,
1974), ajudam a compreender como percepções individuais moldam o comportamento
de adesão.
O modo como o paciente enfrenta sua doença afeta
diretamente seu bemestar e prognóstico. Lazarus e Folkman (1984) classificaram
as estratégias de coping em:
• Coping focado no problema: esforços
para modificar a situação estressora (ex.: planejamento do tratamento).
• Coping focado na emoção: esforços para
regular as emoções associadas ao estresse (ex.: busca de apoio emocional).
Estratégias adaptativas, como o replanejamento positivo e o
suporte social, estão associadas a melhor qualidade de vida.
Somatização:
Conceito e Implicações
A somatização
refere-se à expressão de sofrimento
psicológico por meio de sintomas físicos, para os quais não se encontra
explicação médica suficiente. Esses sintomas são reais e geram sofrimento
significativo, embora não sejam atribuíveis a doenças orgânicas específicas.
A somatização pode envolver:
• Dores
(de cabeça, musculares, abdominais).
• Fadiga
crônica.
• Distúrbios
gastrointestinais.
• Palpitações
e tonturas.
Segundo Lipowski (1988), a somatização é um fenômeno
transdiagnóstico que pode ocorrer em transtornos somatoformes, transtornos
depressivos e transtornos de ansiedade.
Diversos fatores explicam a somatização:
• Modelos de socialização: Em culturas
onde a expressão emocional é desencorajada, o sofrimento tende a ser comunicado
através do corpo.
• Processos de atenção: Indivíduos
propensos à somatização tendem a monitorar intensamente sensações corporais,
interpretando-as como sinais de doença.
• Reforçamento social: O ganho secundário
(atenção, afastamento de responsabilidades) pode reforçar a manifestação
somática dos sintomas.
O DSM-5 categoriza os transtornos relacionados à
somatização como:
• Transtorno
de Sintomas Somáticos.
• Transtorno
de Ansiedade de Doença.
• Transtorno
de Conversão.
Esses transtornos exigem abordagem psicológica cuidadosa,
voltada para o reconhecimento do sofrimento e a promoção de estratégias de
enfrentamento mais adaptativas.
Abordagens de
Intervenção
A psicoterapia é um recurso essencial tanto para pacientes
com doenças crônicas quanto para aqueles que apresentam somatização.
• Terapia Cognitivo-Comportamental: Foca
na reestruturação de pensamentos disfuncionais, no manejo de sintomas e no
desenvolvimento de habilidades de enfrentamento.
• Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT):
Promove a aceitação da experiência interna e o compromisso com ações
consistentes com valores pessoais.
• Psicoterapia Psicodinâmica: Pode ser
útil para explorar conflitos emocionais subjacentes à manifestação somática.
Intervenções educativas ajudam os pacientes a compreender
melhor sua condição, a reconhecer fatores emocionais que afetam seus sintomas e
a adotar comportamentos de autocuidado.
A psicoeducação é particularmente eficaz em programas de
manejo de doenças crônicas, como diabetes e fibromialgia.
Equipe multiprofissional (psicólogos, médicos, enfermeiros,
fisioterapeutas, assistentes sociais) é essencial para oferecer cuidado
integral.
Programas de reabilitação cardíaca, por exemplo, combinam
exercício supervisionado, suporte psicológico e orientação nutricional.
• Validar
o sofrimento do paciente, evitando minimizar seus sintomas.
• Trabalhar
a consciência emocional e a comunicação de sentimentos.
• Incentivar
a prática de mindfulness e técnicas de relaxamento.
• Evitar
exames médicos desnecessários, focando em intervenções psicossociais.
A compreensão dos aspectos psicológicos das doenças
crônicas e da somatização é essencial para a prática clínica contemporânea. O
reconhecimento da interação entre fatores emocionais e físicos permite uma
abordagem mais humana, integral e eficaz do cuidado em saúde.
A atuação do psicólogo é indispensável na promoção da
qualidade de vida, no fortalecimento da autonomia do paciente e na construção
de estratégias de enfrentamento que favoreçam o bem-estar, mesmo diante de
condições crônicas ou sintomas inexplicáveis.
Investir em práticas preventivas, educativas e
terapêuticas, baseadas no modelo biopsicossocial, é um caminho necessário para
superar os limites do paradigma biomédico tradicional e atender às necessidades
reais dos indivíduos em sofrimento.
• LAZARUS,
Richard S.; FOLKMAN, Susan. Stress,
Appraisal, and Coping. New York: Springer, 1984.
• LIPOWSKI,
Zbigniew J. Somatization: The concept
and its clinical application. The American Journal of Psychiatry, v. 145,
n. 11, p. 1358-1368, 1988.
• KATON,
Wayne J. Epidemiology and treatment of
depression in patients with chronic medical illness. Dialogues in Clinical
Neuroscience, v. 13, n. 1, p. 7–23, 2011.
• ENGEL,
George L. The clinical application of
the biopsychosocial model. American Journal of Psychiatry, v. 137, n. 5, p.
535–544, 1980.
• ORGANIZAÇÃO
MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Global status
report on noncommunicable diseases 2010. Geneva: WHO, 2011.
• ROSENSTOCK,
Irwin M. Historical origins of the
Health Belief Model. Health Education Monographs, v. 2, p. 328–335, 1974.
A Atuação do Psicólogo em Hospitais e Serviços de Saúde
A atuação do psicólogo nos hospitais e nos serviços de saúde representa um campo fundamental de prática
profissional que transcende a
tradicional dicotomia entre saúde física e saúde mental. Este profissional
desempenha um papel essencial no cuidado integral do paciente, atuando na
promoção da saúde, prevenção de agravos, apoio ao enfrentamento de doenças,
adesão ao tratamento e no suporte às equipes multiprofissionais. Diante das
transformações nos perfis epidemiológicos e das exigências de uma abordagem biopsicossocial
da saúde, a inserção da Psicologia em ambientes hospitalares e de atenção à
saúde ampliou-se significativamente nas últimas décadas.
O presente texto discute as origens, fundamentos,
modalidades de atuação, desafios e perspectivas do trabalho do psicólogo em
hospitais e serviços de saúde.
Psicologia
Hospitalar e da Saúde: Definições e Evolução Histórica
A Psicologia
Hospitalar é o campo de atuação do psicólogo voltado para a promoção da
saúde mental, a prevenção de sofrimento emocional e a assistência psicológica
aos pacientes internados, seus familiares e as equipes de saúde em ambientes
hospitalares.
Originou-se nas primeiras décadas do século XX,
inicialmente atrelada à avaliação psicológica de pacientes e, progressivamente,
expandiu suas funções para incluir intervenções clínicas, suporte emocional e
trabalho interdisciplinar.
No Brasil, o reconhecimento da importância da Psicologia Hospitalar foi impulsionado a partir dos anos 1970 e 1980, com a ampliação dos cursos de Psicologia e a criação de serviços de psicologia em hospitais universitários.
A Psicologia da
Saúde, por sua vez, abrange um espectro mais amplo, incluindo intervenções
em todos os níveis de atenção à saúde (atenção básica, média e alta
complexidade), com foco na promoção da saúde, na prevenção de doenças e no
enfrentamento de condições crônicas.
A Psicologia da Saúde fundamenta-se no modelo
biopsicossocial e atua na interface entre os fatores biológicos, psicológicos e
sociais que influenciam o processo saúde-doença.
A atuação do psicólogo nos serviços de saúde baseia-se em
princípios que rompem com o modelo biomédico tradicional e reconhecem a saúde
como um fenômeno multidimensional:
• Modelo Biopsicossocial: Proposto por
George Engel (1977), esse modelo compreende que o adoecimento resulta da
interação entre fatores biológicos, psicológicos e sociais.
• Integralidade do Cuidado: A atenção à saúde deve contemplar todas as dimensões do
ser humano, considerando suas
necessidades físicas, emocionais, sociais e espirituais.
• Humanização da Saúde: Movimentos como a
Política Nacional de Humanização (Brasil, 2004) enfatizam a importância da
escuta qualificada, do acolhimento e do respeito à singularidade dos sujeitos
nos serviços de saúde.
Esses fundamentos norteiam a prática do psicólogo
hospitalar e de saúde, orientando intervenções centradas no paciente e no
fortalecimento da autonomia.
Modalidades de Atuação do Psicólogo em Hospitais
O suporte psicológico ao paciente hospitalizado envolve:
• Avaliação Psicológica: Levantamento de
necessidades emocionais, cognitivas e comportamentais que possam impactar o
processo de adoecimento e tratamento.
• Apoio Psicológico: Intervenções breves
focadas na escuta, manejo da ansiedade, regulação emocional e fortalecimento de
estratégias de enfrentamento.
• Psicoterapia Breve: Em casos indicados,
o psicólogo pode conduzir processos psicoterapêuticos focados na adaptação ao
adoecimento, no luto antecipatório ou no enfrentamento de diagnósticos graves.
A hospitalização é frequentemente vivenciada como
experiência de vulnerabilidade, perda de controle e ameaça à integridade física
e psíquica, o que exige intervenções sensíveis e acolhedoras.
O impacto da hospitalização estende-se aos familiares, que
podem apresentar sofrimento emocional, angústia, sentimentos de impotência e
desorganização familiar.
O psicólogo atua:
• No
acolhimento das famílias.
• Na
mediação da comunicação entre equipe de saúde e familiares.
• No
apoio em situações de tomada de decisão difícil (ex.: consentimento informado,
cuidados paliativos).
• Na
preparação para o cuidado domiciliar, alta hospitalar ou luto.
O ambiente hospitalar impõe exigências emocionais
intensas às equipes de saúde, que lidam diariamente com sofrimento, morte e
pressões institucionais.
O psicólogo pode:
• Realizar
ações de apoio psicológico às equipes.
• Promover
grupos de apoio e rodas de conversa.
• Desenvolver
estratégias de prevenção do estresse ocupacional, burnout e sofrimento moral.
• Mediar
conflitos interpessoais e fortalecer o trabalho em equipe.
A atenção ao cuidado do cuidador é fundamental para a
sustentabilidade do cuidado em saúde.
O psicólogo hospitalar também
intervém em contextos
específicos, como:
• Unidades de Terapia Intensiva (UTI):
Apoio a pacientes em estado crítico e seus familiares.
• Oncologia: Enfrentamento do câncer,
apoio em decisões terapêuticas e cuidados paliativos.
• Pediatria: Apoio a crianças
hospitalizadas e seus familiares, favorecendo a compreensão e adaptação à
hospitalização.
• Cuidados Paliativos: Atenção integral a
pacientes com doenças avançadas, priorizando a qualidade de vida e a dignidade
no processo de morrer.
Atuação do Psicólogo
em Serviços de Saúde
Na atenção básica, o psicólogo contribui para:
• Promoção
da saúde mental comunitária.
• Prevenção
de agravos psicológicos.
• Apoio
a grupos vulneráveis (gestantes, adolescentes, idosos).
• Intervenções
em grupos educativos e terapêuticos.
A Estratégia Saúde da Família (ESF) no Brasil representa um
importante espaço de inserção para psicólogos.
Em ambulatórios e serviços especializados (ex.: saúde
mental, reabilitação, saúde da mulher, doenças crônicas), o psicólogo atua em:
• Atendimento
individual e em grupo.
• Apoio
à adesão a tratamentos complexos.
• Promoção
de autocuidados e autonomia dos pacientes.
• Reabilitação
de capacidades físicas, cognitivas e sociais.
O apoio matricial é uma estratégia de compartilhamento de
saberes entre especialistas e equipes generalistas, fortalecendo a
resolutividade dos serviços de saúde.
O psicólogo participa de:
• Discussões
de casos.
• Capacitação
de profissionais.
• Planejamento
de ações interdisciplinares de promoção da saúde.
Essa prática valoriza a construção coletiva do cuidado e a
articulação intersetorial.
Desafios da Atuação
do Psicólogo em Saúde
Em muitos contextos, ainda prevalece a ideia de que a
atenção psicológica é secundária em relação aos cuidados médicos, o que
dificulta a efetiva integração do psicólogo nas equipes.
A insuficiência de recursos humanos, materiais e
estruturais limita a abrangência e a continuidade dos serviços psicológicos nos
hospitais e unidades de saúde.
A lógica de produtividade e eficiência que domina os serviços de saúde pode entrar em conflito com o tempo e a complexidade exigidos pelas
intervenções psicológicas.
Nem sempre a formação acadêmica proporciona aos psicólogos
as competências específicas necessárias para a atuação em contextos
hospitalares e de saúde, como manejo do luto, cuidados paliativos e trabalho
interdisciplinar.
• Investir
em formação específica em Psicologia da Saúde e Hospitalar.
• Fortalecer
a participação em equipes multiprofissionais.
• Desenvolver
projetos de pesquisa e extensão voltados para a prática em saúde.
• Promover
a educação permanente em saúde e o trabalho em redes colaborativas.
• Valorizar
a dimensão ética, relacional e humanizadora do cuidado.
O psicólogo, ao atuar em hospitais e serviços de saúde,
ocupa uma posição estratégica para promover o cuidado integral dos pacientes,
apoiar suas famílias, fortalecer as equipes e contribuir para a humanização dos
serviços.
Seu trabalho é atravessado pela complexidade dos processos
saúde-doença, pela necessidade de articulação com múltiplos saberes e pela
busca constante de práticas inovadoras que respondam às necessidades concretas
da população.
A Psicologia da Saúde e Hospitalar reafirma a importância
de considerar o ser humano em sua totalidade, respeitando sua história, suas
emoções, seus vínculos e sua capacidade de enfrentamento, mesmo diante das mais
difíceis adversidades.
• ENGEL,
George L. The need for a new medical
model: a challenge for biomedicine. Science, v. 196, p. 129-136, 1977.
• BRASIL.
Política Nacional de Humanização da
Atenção e Gestão do SUS. Ministério da Saúde, 2004.
• YAMAMOTO,
Oswaldo H.; COSTA JUNIOR, Francisco Severino da. Psicologia hospitalar: teoria e prática. São Paulo: Cortez, 2005.
• ANTUNES,
Vânia. Psicologia Hospitalar: uma
abordagem multiprofissional. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.
• STROPPA,
Arlete Leal. Psicologia da Saúde: novas
perspectivas de atuação. Curitiba: Juruá, 2012.
• LIPP, Marilda Emanuel Novaes. Psicologia Hospitalar: o paciente, o hospital e a doença. Campinas: Papirus, 2001.
Acesse materiais, apostilas e vídeos em mais de 3000 cursos, tudo isso gratuitamente!
Matricule-se AgoraAcesse materiais, apostilas e vídeos em mais de 3000 cursos, tudo isso gratuitamente!
Matricule-se Agora