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Noções de Direitos Humanos e Cidadania

 

 NOÇÕES DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA

  


Fundamentos Históricos e Conceituais

 

O que são Direitos Humanos?

 

 

1. Introdução

Os Direitos Humanos são um conjunto de garantias fundamentais inerentes a todos os seres humanos, independentemente de nacionalidade, raça, sexo, religião, classe social, orientação sexual ou qualquer outra condição. Eles constituem o alicerce jurídico, ético e político de sociedades democráticas modernas e estão diretamente relacionados à proteção da dignidade humana, à promoção da igualdade e à preservação da liberdade. A ideia de que todo ser humano possui direitos que devem ser respeitados e protegidos é o núcleo conceitual dos Direitos Humanos.

2. Conceito de Direitos Humanos

Direitos Humanos são normas que reconhecem e protegem a dignidade de todos os seres humanos. Eles regem a forma como indivíduos vivem em sociedade e como os governos devem tratar seus cidadãos. De acordo com Bobbio (1992), os direitos humanos não são apenas uma questão jurídica, mas também histórica e filosófica, pois expressam o grau de civilização alcançado por determinada sociedade.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 10 de dezembro de 1948, é o documento internacional mais emblemático sobre o tema. 

Seu primeiro artigo sintetiza o espírito desses direitos: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos.”

3. Princípios Universais dos Direitos Humanos

Três princípios norteiam e fundamentam os Direitos Humanos: dignidade, igualdade e liberdade. Esses princípios são considerados universais, ou seja, aplicam-se a todas as pessoas, em qualquer tempo ou lugar.

3.1 Dignidade Humana

A dignidade é o valor intrínseco de cada ser humano, independentemente de suas características pessoais. É o princípio mais fundamental dos Direitos Humanos, pois reconhece que cada indivíduo tem direito a ser tratado com respeito, consideração e humanidade. A dignidade é inalienável e não pode ser concedida ou retirada por autoridades estatais.

3.2 Igualdade

A igualdade nos Direitos Humanos significa que todos os indivíduos devem ter os mesmos direitos e ser tratados de maneira equitativa perante a lei e na sociedade. Isso não implica uniformidade, mas sim a eliminação de discriminações baseadas em raça, gênero, orientação sexual, religião ou qualquer outro fator. A igualdade busca garantir oportunidades

justas para todos.

3.3 Liberdade

A liberdade abrange a autonomia dos indivíduos para tomar decisões sobre sua própria vida, expressar opiniões, praticar religiões, associar-se e circular livremente. A liberdade deve ser garantida desde que não infrinja os direitos dos demais. Esse princípio é essencial para o exercício da cidadania e da democracia.

4. Direitos Humanos versus Direitos Civis

É comum a confusão entre os termos “direitos humanos” e “direitos civis”, mas embora relacionados, eles possuem diferenças conceituais e históricas importantes.

4.1 Direitos Humanos

Como já mencionado, são direitos universais, inalienáveis e indivisíveis, reconhecidos internacionalmente e válidos para todos os seres humanos. Abrangem diversas dimensões da vida humana, como os direitos civis, políticos, sociais, econômicos, culturais e coletivos. São reconhecidos em tratados e convenções internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, os Pactos Internacionais da ONU e outros documentos multilaterais.

4.2 Direitos Civis

Os direitos civis são um subconjunto dos direitos humanos. Referem-se às liberdades fundamentais do indivíduo perante o Estado, tais como a liberdade de expressão, de pensamento, de religião, de reunião e associação, o direito à propriedade e à igualdade perante a lei. Surgiram historicamente nas lutas contra regimes autoritários, especialmente no contexto do liberalismo europeu dos séculos XVIII e XIX. A consolidação dos direitos civis esteve associada à formação do Estado de Direito.

Portanto, enquanto os direitos humanos têm um escopo mais amplo e internacional, os direitos civis são frequentemente regulados por constituições nacionais e fazem parte dos ordenamentos jurídicos internos dos países.

5. Universalidade e Desafios

Os Direitos Humanos têm como característica essencial a universalidade, ou seja, devem valer para todos os povos e culturas. No entanto, sua aplicação enfrenta inúmeros desafios, como conflitos armados, desigualdades estruturais, intolerância, xenofobia, racismo, autoritarismo e violações cometidas por governos ou agentes privados.

Um dos grandes dilemas contemporâneos está na tensão entre o universalismo dos direitos humanos e o relativismo cultural. Algumas culturas alegam que determinadas práticas não devem ser julgadas com base em valores ocidentais, o que gera debates sobre até que ponto a diversidade cultural pode justificar a violação de direitos fundamentais.

6. Conclusão

Compreender o que são os Direitos Humanos é essencial para fortalecer uma sociedade democrática e plural. Seus princípios de dignidade, igualdade e liberdade formam a base ética de qualquer convivência justa. A distinção entre direitos humanos e direitos civis ajuda a entender como essas garantias se manifestam tanto no plano internacional quanto no contexto jurídico de cada nação. Apesar dos desafios à sua efetivação, os Direitos Humanos continuam sendo uma referência vital na construção de uma ordem mundial mais humana e solidária.


Referências Bibliográficas

       BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 1992.

       DONNELLY, Jack. Universal Human Rights in Theory and Practice.

Ithaca: Cornell University Press, 2013.

       ONU – Organização das Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948.

       PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva, 2012.

       SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais.

Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.

 

 

A DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS (1948)

 

1. Introdução

A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) é um dos documentos mais importantes da história contemporânea. Adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, em Paris, representa um marco ético, jurídico e político na afirmação da dignidade humana e dos direitos fundamentais universais. Trata-se de uma resposta direta às atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra Mundial e visa assegurar a proteção dos indivíduos contra abusos de poder, injustiças e discriminações de qualquer natureza.

A DUDH foi elaborada com a participação de representantes de diversas culturas e sistemas jurídicos do mundo, simbolizando um consenso global em torno dos valores fundamentais de liberdade, justiça e paz.

2. Contexto Histórico da Declaração

A Segunda Guerra Mundial (1939–1945) expôs ao mundo o horror de genocídios, campos de extermínio, perseguições étnicas e violações sistemáticas de direitos básicos. O Holocausto, em particular, foi um divisor de águas na consciência moral da humanidade. Em 1945, com o fim do conflito, as Nações Unidas foram fundadas com o compromisso de prevenir guerras futuras e promover a paz, a segurança e os direitos humanos.

Logo em sua Carta fundacional, a ONU afirmou seu propósito de reafirmar a fé nos direitos fundamentais do ser humano e na dignidade da

pessoa. Em 1946, foi criada a Comissão de Direitos Humanos, presidida por Eleanor Roosevelt, que liderou os trabalhos de redação da Declaração Universal. 

O documento final foi aprovado por 48 votos favoráveis, 8 abstenções e nenhum voto contrário.

3. Estrutura e Conteúdo da DUDH

A Declaração Universal dos Direitos Humanos é composta por um preâmbulo e 30 artigos. O preâmbulo contextualiza a necessidade do documento e ressalta a importância do reconhecimento da dignidade intrínseca de todos os membros da família humana.

Os artigos são organizados em torno de direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais. Entre os principais direitos assegurados estão:

       Direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal (Art. 3);

       Proibição da escravidão e da tortura (Art. 4 e 5);

       Igualdade perante a lei e acesso à justiça (Art. 6 a 10);

       Liberdade de pensamento, consciência, religião e expressão (Art. 18 e 19);

        Direito ao trabalho, à educação e à seguridade social (Art. 22 a 26);

            Direito à participação política e à autodeterminação (Art. 21).

Esses direitos não são hierarquizados; ao contrário, são considerados interdependentes e indivisíveis, ou seja, a plena realização de um depende da efetividade dos demais.

4. Caráter Jurídico e Político da Declaração

A DUDH é um documento declaratório, ou seja, não possui força jurídica vinculante como um tratado internacional. No entanto, seu valor jurídico evoluiu com o tempo, sendo hoje reconhecida como parte do direito internacional consuetudinário, influenciando a formulação de constituições, leis internas e tratados de direitos humanos em todo o mundo.

Diversos instrumentos internacionais foram elaborados com base na DUDH, como:

           O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966);

O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966);

       A Convenção sobre a Eliminação da Discriminação Racial (1965);

       A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (1979).

Além disso, a Declaração tornou-se uma referência moral e política incontestável, servindo de base para a ação de organizações não governamentais, tribunais internacionais e movimentos sociais em defesa dos direitos fundamentais.

5. A DUDH no Brasil

O Brasil foi um dos países que votaram a favor da DUDH em 1948. A influência da Declaração pode ser percebida na Constituição Federal de

1948. A influência da Declaração pode ser percebida na Constituição Federal de 1988, chamada de “Constituição Cidadã”, que incorporou em seu texto diversos princípios da DUDH, especialmente nos artigos que tratam dos direitos e garantias fundamentais (Título II).

O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a importância dos tratados de direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro, e o país é signatário de diversos instrumentos internacionais derivados da DUDH.

6. Relevância Atual e Desafios

Mesmo após mais de sete décadas de sua promulgação, a Declaração Universal dos Direitos Humanos permanece atual e necessária. Ainda hoje, bilhões de pessoas vivem em situações de miséria, guerra, opressão política, discriminação racial, violência de gênero e violações de direitos básicos.

A globalização, os fluxos migratórios, os conflitos armados, as mudanças climáticas e as novas tecnologias criam novos cenários e desafios para a proteção dos direitos humanos. A DUDH continua sendo um guia ético e político para governos e sociedades na construção de um mundo mais justo, solidário e sustentável.

É preciso lembrar que os direitos humanos não são concedidos, mas reconhecidos. Cabe aos Estados garanti-los e às sociedades defendê-los constantemente.

7. Conclusão

A Declaração Universal dos Direitos Humanos é um marco fundamental na história. Embora não tenha caráter jurídico obrigatório, sua influência é imensa e duradoura. Ao estabelecer um padrão comum de direitos a todos os povos e nações, a DUDH representa uma promessa global de dignidade, liberdade e justiça. Seu legado continua a inspirar legislações, movimentos sociais e a luta cotidiana por um mundo onde a humanidade seja plenamente respeitada em todas as suas expressões.


Referências Bibliográficas

       BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 1992.

       ONU – Organização das Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948. Disponível em: https://www.un.org

       PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva, 2012.

       RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. São Paulo:

Saraiva, 2020.

       DONNELLY, Jack. Universal Human Rights in Theory and Practice.

Ithaca: Cornell University Press, 2013.

 

 

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS HUMANOS

 

1. Introdução

Os Direitos Humanos, embora sistematizados no século XX, têm raízes profundas na história da civilização.

Sua construção foi lenta, marcada por lutas sociais, transformações filosóficas e marcos jurídicos fundamentais. Desde as primeiras reflexões éticas na Antiguidade até os grandes documentos modernos, a trajetória dos Direitos Humanos revela um movimento contínuo em direção à universalização da dignidade, da liberdade e da justiça. Este texto apresenta uma visão panorâmica da evolução histórica dos Direitos Humanos, abordando suas origens filosóficas e jurídicas, os documentos fundadores das liberdades modernas e a consolidação desse conceito no pós-Segunda Guerra Mundial, com a criação da Organização das Nações Unidas (ONU).

2. Origens Filosóficas e Jurídicas

As primeiras ideias associadas aos Direitos Humanos surgem na Antiguidade, ainda que de maneira embrionária e limitada a determinados grupos sociais.

2.1 Grécia Antiga

Na Grécia, os filósofos começaram a refletir sobre a justiça, a natureza humana e o papel da lei. Sócrates, Platão e Aristóteles discutiram temas como a equidade e o bem comum. 

A ideia de que existe uma “lei natural” — superior às leis dos homens — foi proposta pelos estóicos, como Zenão de Cítio, e defendia que todo ser humano possui razão e, por isso, é dotado de direitos naturais. No entanto, a aplicação prática desses ideais era restrita a cidadãos livres, excluindo mulheres, escravos e estrangeiros.

2.2 Roma Antiga

O Direito Romano influenciou profundamente o desenvolvimento jurídico ocidental. Conceitos como “jus naturale” (direito natural) e “jus gentium” (direito dos povos) serviram de base para pensar uma ordem jurídica universal. Cícero, jurista e filósofo romano, defendia que a justiça derivava da razão e da natureza, sendo anterior às convenções sociais. Apesar disso, o Império Romano mantinha hierarquias sociais rígidas e práticas excludentes.

2.3 O Iluminismo

Foi no século XVIII, durante o Iluminismo, que a ideia de direitos naturais universais ganhou força e passou a ter impacto político direto. Filósofos como John Locke, Jean-Jacques Rousseau, Montesquieu e Voltaire formularam princípios fundamentais para os direitos humanos modernos: liberdade individual, igualdade jurídica, soberania popular e separação dos poderes.

Locke, por exemplo, defendia que todos os seres humanos tinham direitos naturais à vida, à liberdade e à propriedade. Rousseau introduziu o conceito de contrato social, segundo o qual o poder legítimo deriva do consentimento dos governados. Esses pensamentos influenciaram diretamente as

revoluções liberais do final do século XVIII.

3. Documentos Fundadores das Liberdades Modernas

Três documentos históricos se destacam como pilares jurídicos e políticos dos direitos humanos modernos: a Magna Carta (1215), a Declaração de Independência dos Estados Unidos (1776) e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789), da Revolução Francesa.

3.1 Magna Carta (1215)

Assinada pelo rei João Sem Terra da Inglaterra, a Magna Carta foi um marco na limitação do poder absoluto do monarca. Entre outras garantias, estabelecia que ninguém poderia ser preso ou punido sem o devido processo legal, antecipando o princípio do habeas corpus. Ainda que tenha sido originalmente um acordo entre o rei e a nobreza, o documento abriu caminho para o constitucionalismo e o Estado de Direito (BOBBIO, 1992).

3.2 Declaração de Independência dos EUA (1776)

Redigida por Thomas Jefferson, a declaração proclamou que “todos os homens são criados iguais” e que têm direitos inalienáveis como “vida, liberdade e busca da felicidade”. Inspirada nas ideias iluministas, a declaração rompeu com o colonialismo britânico e defendeu o direito à autodeterminação dos povos. Ela influenciou não apenas o sistema jurídico dos Estados Unidos, mas também movimentos de independência em todo o mundo.

3.3 Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789)

Proclamada durante a Revolução Francesa, essa declaração foi um divisor de águas na afirmação dos direitos civis e políticos universais. Estabeleceu princípios como a liberdade de expressão, a igualdade perante a lei, a soberania popular e a inviolabilidade da propriedade privada. Seu Artigo 1º afirma: “Os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos.” Esses documentos não foram isentos de contradições (como a exclusão de mulheres, escravizados e pobres), mas inauguraram uma nova concepção de cidadania e legitimidade política.

4. Pós-Guerra e Criação da ONU

O século XX testemunhou as duas guerras mundiais mais destrutivas da história. A barbárie da Segunda Guerra Mundial (1939–1945), incluindo o Holocausto, chocou a consciência global e impulsionou a criação de instituições e normas internacionais voltadas à defesa dos direitos humanos. 4.1 Fundação da ONU (1945)

Em 1945, representantes de 50 países reuniram-se em São Francisco e criaram a Organização das Nações Unidas (ONU). A Carta da ONU, documento fundacional da organização, já previa o compromisso com a promoção e o respeito aos direitos humanos e às

liberdades fundamentais.

4.2 Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948)

Em 10 de dezembro de 1948, a Assembleia Geral da ONU aprovou a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH). Com 30 artigos, ela afirma a dignidade inerente e os direitos iguais e inalienáveis de todos os seres humanos. A DUDH não tem caráter vinculante, mas serve como base para tratados, constituições nacionais e legislações diversas. Representa o primeiro esforço articulado da comunidade internacional em criar um padrão comum de direitos para toda a humanidade (PIOVESAN, 2012).

5. Conclusão

A evolução dos Direitos Humanos é resultado de um longo processo histórico e filosófico, construído sobre reflexões e lutas por liberdade, justiça e igualdade. Das ideias da Grécia e Roma à sistematização iluminista e às revoluções modernas, dos horrores da guerra à fundação da ONU, os direitos humanos foram ganhando legitimidade e abrangência global. Ainda que enfrentem desafios constantes, continuam sendo um pilar fundamental da convivência civilizada e da ordem democrática internacional.

 

Referências Bibliográficas

       BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 1992.

       ONU – Organização das Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948. Disponível em: https://www.un.org

       PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva, 2012.

       RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. São Paulo:

Saraiva, 2020.

       DONNELLY, Jack. Universal Human Rights in Theory and Practice.

Ithaca: Cornell University Press, 2013.

 


CLASSIFICAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

 

1. Introdução

A classificação dos Direitos Humanos em diferentes “gerações” ou “dimensões” é uma construção teórica que ajuda a compreender a evolução histórica, política e social desses direitos. Cada geração reflete as demandas específicas de determinado contexto histórico e o avanço das lutas sociais por igualdade, liberdade e dignidade. Ao lado dessa classificação, é fundamental compreender que os direitos humanos são indivisíveis e interdependentes: não há hierarquia entre eles, e a plena realização de um depende do efetivo cumprimento dos demais. Este texto explora a divisão em gerações dos direitos humanos, seu significado prático e os princípios que orientam sua aplicação.

2. Primeira Geração: Direitos Civis e Políticos

A primeira geração de direitos humanos surgiu nos séculos XVII e

XVIII, especialmente a partir das revoluções liberais, como a Revolução Inglesa (1688), a Revolução Americana (1776) e a Revolução Francesa (1789). Esses direitos estão fortemente associados ao pensamento iluminista e à ideia de limitar o poder do Estado sobre o indivíduo.

São direitos de liberdade, voltados à proteção da autonomia individual e à participação política. São denominados “direitos negativos” porque exigem do Estado a abstenção de interferências.

Exemplos de direitos civis e políticos:

       Direito à vida;

       Liberdade de expressão, de consciência e de religião;

       Direito à propriedade;

       Liberdade de reunião e associação;

       Direito ao voto e à participação política;

       Direito ao devido processo legal e à presunção de inocência.

Esses direitos estão expressos em documentos fundamentais como a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1966).

3. Segunda Geração: Direitos Econômicos, Sociais e Culturais

A segunda geração emergiu com a consolidação do capitalismo industrial, nos séculos XIX e XX, e com a percepção de que a liberdade formal era insuficiente diante das desigualdades sociais. Inspirada por movimentos socialistas e sociais-democratas, esta geração buscou assegurar condições materiais mínimas para o exercício pleno da cidadania.

São direitos de igualdade, que exigem ações positivas do Estado, por isso são chamados de “direitos positivos”.

Exemplos de direitos sociais, econômicos e culturais:

       Direito ao trabalho e à justa remuneração;

       Direito à educação;

       Direito à saúde;

       Direito à seguridade social;

       Direito à moradia;

       Direito à cultura.

Esses direitos estão consagrados em documentos como o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) e em várias constituições modernas, incluindo a Constituição Federal do Brasil de 1988.

4. Terceira Geração: Direitos Difusos e Coletivos

A terceira geração de direitos humanos surge na segunda metade do século XX, especialmente após as guerras mundiais, o avanço da globalização e a crescente consciência ecológica e humanitária. Essa geração não se refere apenas ao indivíduo, mas a grupos sociais ou à coletividade como um todo, considerando interesses transindividuais.

São direitos de solidariedade, que demandam a cooperação entre povos e nações, indo além da atuação estatal isolada.

Exemplos de direitos de terceira geração:

       Direito à paz;

       Direito ao desenvolvimento;

       Direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado;

       Direito à autodeterminação dos povos;

       Direito à comunicação e à informação;

       Direito à proteção do patrimônio comum da humanidade.

Esses direitos estão presentes em declarações como a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento (1986) e na Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992).

5. Indivisibilidade e Interdependência dos Direitos

Um dos princípios fundamentais dos direitos humanos é a sua indivisibilidade, ou seja, todos os direitos — civis, políticos, sociais, econômicos, culturais e coletivos — possuem o mesmo valor e importância. Não é possível garantir a liberdade de expressão sem acesso à educação, nem assegurar o direito à saúde sem condições dignas de moradia ou saneamento básico.

Além disso, os direitos humanos são interdependentes, pois a realização de um favorece o exercício dos demais. A educação, por exemplo, não é apenas um direito social: ela é condição essencial para o exercício da cidadania política, da liberdade de expressão e da autonomia econômica.

Esse entendimento foi reforçado pela Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em Viena em 1993, que afirmou em seu documento final que “todos os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados”.

6. Aplicações Práticas e Exemplos

Para ilustrar a aplicação prática dessas gerações de direitos, consideremos os seguintes exemplos:

       Primeira geração: Um indivíduo que é preso sem julgamento justo tem seu direito civil violado, como o habeas corpus e o devido processo legal.

       Segunda geração: Um trabalhador sem acesso ao salário mínimo ou que vive sem condições básicas de saúde pública sofre violações de seus direitos sociais.

       Terceira geração: Uma população afetada por desastres ambientais provocados por poluição industrial está vendo violado seu direito coletivo ao meio ambiente equilibrado.

No Brasil, os três níveis de direitos estão incorporados na Constituição de 1988, que assegura desde os direitos individuais (art. 5º), passando pelos direitos sociais (art. 6º), até a proteção ao meio ambiente e à diversidade cultural.

7. Conclusão

A classificação dos direitos humanos em gerações permite visualizar sua evolução histórica e os diferentes focos de proteção. Embora tenham surgido em

momentos distintos, todas essas dimensões são complementares, e nenhuma deve ser considerada inferior a outra. O pleno exercício da cidadania e a construção de uma sociedade justa requerem o reconhecimento da indivisibilidade e da interdependência dos direitos humanos. Cabe ao Estado, à sociedade e à comunidade internacional garantir e promover esses direitos de forma integrada e contínua.


Referências Bibliográficas

       BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 1992.

       SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais.

Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.

       RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. São Paulo:

Saraiva, 2020.

       ONU – Organização das Nações Unidas. Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948. Disponível em: https://www.un.org

       PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva, 2012.

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